Sempre tive verdadeira atração por biografias, entrevistas, diários e quaisquer compilações de cartas enviadas por escritores. Por isso, não é de se estranhar que os filmes sobre escritores também chamem a minha atenção.
Assim que encontro um novo título, faço questão de assisti-lo. Mesmo que o filme não trate da escrita em si, alguns trazem boas reflexões sobre a vida dos escritores.
Então pegue o seu refrigerante, estoure a pipoca e reserve o seu lugar, porque o filme já vai começar!
Filmes sobre escritores disponíveis no Netflix
De Amor e Trevas (2015)
O filme conta a infância do escritor Amos Oz em Jerusalem. Roteirizado e dirigido pela maravilhosa Natalie Portman, é uma adaptação do livro homônimo de Amós – e conta com a participação especial do próprio autor no início.
Amos Oz, além de escritor, foi um ativista político, fundador do movimento pacifista israelense Paz Agora (Shalom Achschaw). Depois de ver o filme, não é difícil concluir porque ele passou a vida lutando pela paz.
Durante a Primeira Guerra Mundial, seus pais saíram da Ucrânia para se refugiar na Lituânia e, depois, em Jerusalém, durante o Mandato Britânico da Palestina. Assim, ele acompanhou, durante toda a infância, acontecimentos históricos como a independência de Jerusalém, a insurreição judaica na Palestina e a Guerra árabe-israelense.
Sua mãe, marcada pelos sucessivos conflitos enfrentados, cometeu suicídio quando ele tinha 12 anos – fato que o marcou pelo resto da vida e o transformou em um dos mais conhecidos e influentes escritores israelitas. Já seu pai, também escritor, tinha uma extensa biblioteca em casa e era falante fluente de hebraico.
É um filme maravilhoso e que vale a pena ser visto porque mostra que a formação do escritor está longe de ser romântica. Mesmo ante tantas adversidades, Amos Oz lutou pelo que acreditava até o último minuto da vida, com a leveza de quem sabe que é possível tocar o mundo com mensagens de paz mesmo em meio a mais inexplicável guerra.
O mestre dos gênios (2016)
Eis um filme sobre a relação do escritor americano Thomas Wolfe com seu editor Max Perkins. Conhecido por ter descoberto escritores como Ernest Hemingway e F. Scott Fitzgerald, o longa mostra como era a sua relação com os escritores, com foco em Thomas Wolfe.
Quando Wolfe chega ao prédio da editora Charles Scribner’s Sons (situada em Nova Iorque e em atividade até hoje) com o original de Look Homeward, Angel e conquista a confiança de Perkins, vemos o início não apenas da carreira de um grande escritor, mas também de uma grande amizade entre eles.
O filme mostra de maneira magistral o quanto um grande editor pode beneficiar a obra de um escritor. Apesar de ficar em segundo plano e, na maioria das vezes, não receber o devido reconhecimento além das fronteiras do meio editorial, a genialidade do editor é tão ou mais importante do que a do autor.
Uma das melhores sequências do filme é ver a transformação do segundo original de Wolfe (Of Time and the River), desde sua escritura, depois o calhamaço de papel que precisa ser carregado num carrinho até a editora e todo o trabalho conjunto de Wolfe a Perkins para transformar aquela papelada em um romance conciso e canônico.
A Senhora da Van (2015)
Um filme divertido, com tudo o que o fino humor britânico pode oferecer. Alan Bennett é um escritor que segue sua vida tranquila em Camden Town, bairro de Londres, até que, depois de alguns percalços, acaba deixando que Mary Shepherd, uma senhora idosa que mora dentro de uma van, estacione-a dentro de sua garagem.
A medida que a narrativa se desenrola, o espectador tenta montar, assim como o escritor, o quebra-cabeças da vida de Mary com as pequenas peças que ela entrega. Nunca fica claro se o que ela diz é real ou uma mera invenção da sua cabeça de idosa sem-teto; ou ainda se é a mente do escritor que está forçando uma história.
A diversão do filme está em ver como Bennett divide-se em dois e conversa consigo mesmo: uma é sua faceta de escritor, sempre sentada à mesa, tentando encontrar explicações racionais para tudo; e outra é sua parte humana, quase passional, que justifica suas ações com argumentos emocionais.
É um filme que mostra, de maneira bem visual, a relação do escritor consigo mesmo (em eterno conflito) e também com sua fonte de ideias – no caso, a senhora maluca que mora na garagem e que servirá de inspiração para sua futura peça teatral.
O Reencontro (2012)
Monte Wildhorn é um famoso escritor de livros de faroeste que se muda para uma cidadezinha rural em busca de paz e tranquilidade. Após perder a esposa, sua fiel companheira de todos os momentos, ele se torna rabugento e se afunda no alcoolismo.
Mesmo querendo manter distância de toda a bondade dos vizinhos, ele fica longe de ser deixado quieto no seu canto. Seu sobrinho deixa o cachorro aos cuidados dele; a vizinha deixa as crianças; ele é convidado a várias confraternizações da cidade; seu editor vive cobrando um novo livro.
Quando uma das filhas da vizinha descobre que aquele senhor na cadeira de rodas é um grande escritor, ela pede para que ele a ensine como ser uma escritora. E é através de respostas rabugentas, com a ironia que só um ator como Morgan Freeman poderia personificar, o espectador aprende várias lições sobre imaginação e criatividade.
É um filme sensível sobre os altos e baixos da vida de um escritor. O sucesso passageiro, os conflitos com o corpo, o bloqueio criativo, a almejada paz e, principalmente, como a imaginação, a mais importante fonte de ideias, é ilimitada.
Sem limites (2011)
Eddie Morra é um escritor em busca do seu best seller, mas não consegue vencer o bloqueio criativo. Certo dia, ele reencontra seu ex-cunhado, que lhe mostra uma pílula capaz de aumentar ao máximo as capacidades cognitivas de qualquer pessoa e torna-la um gênio instantâneo.
A droga faz com que Eddie viva uma montanha-russa de sucesso, vício e fracasso, levando-o muito além da vida de escritor por ele esperada. Com 100% do cérebro funcionando, Eddie é capaz de lembrar-se de tudo que já leu e ouviu, fazendo cálculos em segundos, aprendendo outras línguas enquanto fala com as pessoas, etc. No entanto, com o ritmo cerebral acelerado, ele precisa tomar a pílula todos os dias.
Trata-se de um filme de ação e, de certa forma, o devaneio que muitos escritores: o de encontrar uma fórmula mágica que os torne mais inteligentes e, consequentemente, famosos, da noite para o dia. Visto do início ao fim, é uma alegoria de que tudo o que vem fácil, vai fácil – ou, ao menos, tem um custo bem mais alto do que o esperado.
Marry Shelley (2018)
Conta os anos de formação da escritora autora do livro Frankenstein, Marry Shelley. Filha do filósofo William Godwin e da feminista e escritora Mary Wollstonecraft, aos 10 dias perdeu a mãe, sendo criada pelo pai e uma madrasta. Ávida leitora desde a infância, desde cedo ela demonstrou interesse pelos romances góticos – mesmo sob os protestos do pai.
Aos 17 anos, em uma viagem a Escócia, ela conhece o poeta Percy Shelley, dando os primeiros passos do que viria a ser o romance entre eles. Muito à frente do seu tempo (ela viveu no início do século XIX), Mary foge de casa para viver com Percy, mesmo ele sendo casado com outra mulher.
A partir de então, o filme mostra como todas as experiências vividas por ela morando com Percy influenciaram-na a escrever uma das histórias mais famosas do mundo: Frankenstein. Com apenas 19 anos, ela escreve sua obra prima e enfrenta todo o preconceito dos editores que preferiram deixar a autoria da primeira edição anônima.
Como eu disse, as biografias de escritores sempre me encantaram. Gosto de ler livros de cartas trocadas entre eles e conhecer suas histórias. Esse filme é uma ótima opção para quem, assim como eu, conhece pouco sobre a trajetória da autora e todos os desafios que ela enfrentou por causa das escolhas que fez.
Uma beleza fantástica (2016)
A jovem Bella Brown sonha em um dia ser uma escritora famosa de contos infantis. Em sua caminhada, ela se muda para uma aconchegante casa, que ela mantém extremamente arrumada e limpa devido a suas manias de organização e limpeza.
(Não fica claro se ela tem TOC mesmo, por isso preferi me referir aqui apenas como “manias”).
Aos poucos, ela se aproxima do seu vizinho e dono da casa onde ela mora, um senhor rabugento, criando um laço de amizade com ele quando recebe um ultimato do corretor da imobiliária: ou ela arruma o matagal dos fundos da casa, ou precisará se mudar.
Enquanto ela arruma o jardim, ele faz seus comentários rabugentos, revelando seu laço afetivo com a jardinagem: era a falecida esposa dele quem cuidava daquele espaço. Na melhor relação mestre e discípula, o filme transcorre de maneira divertida, mostrando como as experiências da vida transformam o nosso trabalho como escritores.
Meia-noite em Paris (2011)
O sonho de Gil é ser um grande roteirista de Hollywood, vivendo uma relação de idolatria com os escritores e artistas dos anos 1920. Ele se mostra insatisfeito com sua carreira de roteirista de filmes menores e está em Paris com sua noiva e data marcada para o casamento.
Mesmo tendo tirado a “sorte grande”, prestes a se casar com uma mulher rica, ele está sempre incomodado com o ar pomposo da família da sua noiva. Em claro conflito, ele sai sozinho para beber e, quando se senta para esperar um táxi e voltar para o hotel, é abordado por pessoas em um carro antigo, todas vestidas como nos anos 1920.
A partir de então, sempre à meia-noite, toda vez que ele entra nesse carro – que passa apenas naquela esquina, naquele horário – ele viaja no tempo e encontra figuras como Hemingway, Zelda e Scott Fitzgerald, Manray, Gertrude Stein, Pablo Picasso e tantos outros.
É um filme mágico e, ao mesmo tempo, realista, sobre como a idolatria a tempos passados e não vividos pode limitar nossa visão dos fatos. A nostalgia do que não vivemos pode ser uma ótima fonte de inspiração, mas apenas enquanto não nos atrapalha para viver o presente.
A mensagem que fica desse filme é sobre como olhar para trás com admiração pelo trabalho dos outros e olhar para o daqui em diante com determinação para construir a própria história.
(Este filme não está mais disponível no Netflix, mas vale muito a pena ser visto.)
Filmes também são fontes de inspiração
Ver filmes sobre a vida de escritores é uma ótima opção para quem quer conhecer mais sobre os desafios da profissão (afinal, os filmes são escritores por escritores) e querem ter a oportunidade de aproveitar o tempo com outras pessoas – afinal, filmes são mais socializantes que livros.
Escolhi apenas os filmes no Netflix, mas você tem algum outro para indicar? Deixe a sua indicação nos comentários, assim aumentamos a lista e partilhamos as melhores obras da sétima arte sobre a arte de escrever.
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